RAPOSILDA E RAPOSOTA

Eram duas raposas amigas. Raposilda era a mais nova.
Um dia, Raposota, que se achava muito inteligente, convidou Raposilda para irem a uma roça, onde havia muitas melancias.
-- Encontrei uma roça com muitas melancias. Vamos lá comer algumas!
-- Mas, não é perigoso?! – perguntou Raposilda, preocupada.
-- Não, não há nenhum perigo! – respondeu Raposota.
-- Então vamos – disse Raposilda, que já estava ansiosa por comer melancia.
As duas saíram juntas, conversando, animadas até que chegaram ao local onde encontraram as melancias. Foram logo escolhendo uma bem grande e comendo. Estava bem madura e deliciosa. Comeram até encher a barriga, depois voltaram para casa.
Raposilda estava muito feliz, pois foi a primeira vez que comera melancia.
-- Que fruta gostosa! Tão doce, tão suculenta! – não parava de falar Raposilda.
-- Não lhe disse? – respondeu Raposota.
-- Amanhã vamos voltar para comermos mais? – falou Raposilda.
-- Bom, talvez – respondeu Raposota.
Na verdade, Raposota sabia que era perigoso, pois dono de roça geralmente tem cachorro, e podia chegar lá a qualquer momento.
No outro dia, Raposilda, toda animada, foi logo chamando a amiga:
-- Então, vamos comer melancia?
-- Acho que hoje não vou – respondeu Raposota.
-- Por quê? – perguntou Raposilda.
-- Bom, é que... bem, eu lhe disse que não era perigoso, mas há perigo, sim. Pode aparecer cachorro!
Raposilda começou a rir. Não acreditava na amiga.
-- Ah, você está é com preguiça, por isso inventa essa história de cachorro! Ontem estivemos lá, comemos muita melancia e não aconteceu nada!
-- Mas pode acontecer! É melhor termos cuidado! – falou Raposota.
-- Bom, se você não quer ir, eu vou só – respondeu Raposilda, e foi andando.
Raposota ficou preocupada pela amiga, mas não estava disposta mesmo a ir.
Raposilda, chegando na roça, começou a comer melancias, com muito gosto.
Estava no melhor da festa, quando de repente apareceu o dono das melancias, acompanhado de um enorme cachorro.

Raposilda ficou paralisada de susto. O cão saltou sobre ela e a segurou pelo pescoço.
O homem dava ordens ao cachorro. Era um cão treinado, muito inteligente.
-- Ora, ora, muito bem! Vamos levar essa danada para casa, não é, companheiro? – o homem falava com o seu cachorro.
Colocou a raposa – que nós conhecemos por Raposilda – dentro de um saco, e voltou para casa.
Em casa mostrou à esposa, que ficou muito encantada.
-- Como ela é bonita! É uma raposa muito nova, ainda. Vou criá-la – disse a mulher, acariciando Raposilda.
-- Você é quem sabe – disse o homem, deixando Raposilda aos cuidados da mulher.
Raposilda estava sendo muito bem tratada naquela casa. A dona lhe dava banho, colocava perfume, penteava os pelos, e fazia muito carinho, além de muita comida gostosa que todo dia dava para ela.
Estava feliz, embora presa por uma coleira, que a dona lhe colocara, para ela não fugir.
Mas o cachorro da casa, apesar de estar sempre do lado de fora, principalmente depois da chegada de Raposilda, pressentia a presença da intrusa, e não estava nada gostando.
Um dia Raposilda tinha tomado um belo banho, e como estivesse tremendo de frio, foi colocada perto da porta, onde havia sol, para ela se aquecer. Não estava mais presa, pois a dona já a considerava mansa. E Raposilda dava mostras de que não queria deixar aquela casa.
Ela estava ali, quietinha, quando de repente apareceu o cachorro. A mulher tinha saído, ocupada com os trabalhos da casa.
O cão rosnou, feroz, e avançou em direção a Raposilda. Ela correu para um lado e para o outro, o cachorro cercava. Raposilda foi obrigada a sair para o quintal. O cão parecia não querer mordê-la, mas só expulsá-la de casa.
Raposilda não encontrou outro jeito, a não ser fugir para o mato.
Por fim, chegou à sua antiga morada, onde ficara Raposota e as demais raposas. Ali, foi cercada por todas as raposas, curiosas de ver como ela estava gorda, perfumada, de pelo limpo e brilhante. Não cessavam de lhe fazer perguntas, principalmente sua amiga Raposota.
-- Onde você esteve todo esse tempo? O que aconteceu com você? Pensávamos que tivesse morrido!
Raposilda, toda vaidosa, fazia mistério. Mas, depois de deixar por alguns momentos todos ansiosos, contou o que acontecera. Só não falou do cachorro. Achava humilhante dizer como fora presa, e depois como teve que fugir de casa.
-- Um homem me pegou e me levou para sua casa. Lá, a mulher dele, uma dama, me servia de criada. Eu passei a ser a dona da casa, e ela fazia tudo para mim. Dava-me banho, penteava meus lindos pelos, e me perfumava toda com os melhores perfumes.
          -- Ooohh! – faziam todas as raposas, admiradas.
-- Vocês podem sentir como estou cheirosa e limpa.
E as raposas se aproximavam, rodeando Raposilda, cheirando, tocando em seu pelo, confirmando o que ela dizia.
-- Ooohh! É verdade! – falavam as raposas, com inveja.
-- Mas, por que você não ficou lá? – perguntou Raposota.
Raçposilda não esperava por essa pergunta.
-- Bom... herr... senti saudades de vocês. Lá não tinha amigas raposas para conversar...
-- E você não vai voltar para lá? – perguntou outra raposa.
-- Não – respondeu Raposilda – prefiro ficar aqui com vocês!
Essa Raposilda é uma tola – pensava consigo Raposota – deixar uma casa onde era tratada como princesa. Amanhã mesmo vou tomar o seu lugar.
No outro dia, Raposota saiu de mansinho e, sem se despedir, nem mesmo da amiga, foi em direção à roça de melancias.
Mas o que ela não sabia era que a roça onde Raposilda fora apanhada, não era a mesma em que as duas estiveram antes. E ali estava o dono, escondido, com uma espingarda. Ele já havia notado que as raposas estavam atacando suas melancias.
Raposota ficou por ali, bem no meio das melancias. Nem queria comer. Só desejava ser apanhada, e ir desfrutar do conforto que Raposilda havia desfrutado. Mal sabia o que lhe esperava.
O homem, vendo a raposa, apontou a espingarda e disparou um tiro, acertando a bunda de Raposota, que soltou um grito, e saiu como louca, correndo.
Chegou em casa, triste, desapontada, e as amigas, rindo dela, começaram a retirar os chumbos do traseiro.
-- Ai! – fazia Raposota toda vez que um chumbinho era arrancado.
As amigas riam, divertidas.
-- Você disse que o dono da roça era muito bom! – queixou-se Raposota para Raposilda.
-- Mas, onde você esteve mesmo? – perguntou Raposilda.
-- No mesmo lugar em que estivemos antes! – respondeu Raposota – ai! ai!
Raposilda não conseguia parar de rir.
-- Mas não foi lá que eu estive sozinha – explicou Raposilda.
Só então Raposota percebeu que havia cometido um engano. Mas a culpada era Raposilda, que não tinha explicado tudo direito.
Por alguns dias Raposota andava com a bunda inchada, e era chamada de poposuda.
Aprendeu uma grande lição por ser invejosa, e desistiu de procurar vida boa.


FIM


Autor: José Isidio
Para minha neta, Milena.
Nanuque-MG, 25/03/2002