A MINHOCA VALENTE

ERA UM MINHOCAL na floresta, perto de um rio. "Minhocal", Milena, se você ainda não sabe, são as casas das minhocas. Vamos dizer, a cidade das minhocas.
Ali morava uma minhoca muito valente e esperta, chamada Minho-lena. Além de esperta, era também a mais bonita das minhocas.
Um dia Minho-lena estava passeando fora do minhocal, com uma de suas amigas, Minho-lili, quando percebeu o chão estremecendo e o barulho de pisadas.
-- É o bicho-homem que vem aí! – falou Minho-lena, assustada.
-- Que bicho-homem? – perguntou Minho-lili, sem se assustar.
-- O bicho-homem! Ele é perigoso para nós. Vamos nos esconder!
E Minho-lena puxou Minho-lili mais que depressa para dentro do mato, e se esconderam.
Um homem, calçando enormes botas de borracha, começou a escavacar a cidade das minhocas, causando grande destruição. Todas que estavam em suas casas foram apanhadas pelo homem e colocadas dentro de uma lata pequena.
Minho-lena e a amiga, aflitas, observavam tudo de seu esconderijo.
Por fim, o homem retirou-se levando todas as minhocas.
-- Vamos seguir as pegadas dele – disse Minho-lena.
-- Não, eu não vou. Ele pode nos apanhar – falou apavorada Minho-lili,  que era uma minhoca muito nova e medrosa.
-- Está bem, então você não precisa ir comigo. Fique aqui, escondida, que eu irei só.
-- Por que você tem que ir? – perguntou Minho-lili.
-- Não vê que toda a nossa família foi levada pelo bicho-homem, e só nós duas ficamos? Eu tenho que ir. Quero ver o que posso fazer.
-- O que você pode fazer com um bicho tão grande e perigoso, como o bicho-homem? Você é apenas uma garota minhoca! – Argumentou Minho-lili.
-- Eu sei! Não sei mesmo o que posso fazer! Mesmo assim, algo me diz que devo ir. Não tenha medo, eu volto logo, prometo.
Minho-lena se despediu da amiga e partiu.

Depois de andar bastante, sempre seguindo as pegadas do homem, mas se esgueirando, e procurando manter-se escondida o máximo possível, por fim avistou o bicho-homem, sentado à beira do rio. Ele estava muito quieto. Minho-lena o avistou pelas costas. Foi se aproximando devagar, com muito cuidado. Chegou bem perto. Então viu, atrás do homem, a lata onde estavam as minhocas.
Minho-lena correu e se escondeu no mato ali perto. Não sabia o que fazer. Como salvar seus parentes e amigos, todos amontoados dentro daquela lata? Depois de pensar um bom tempo, teve uma idéia. Olhando para os lados, viu uma vara com um gancho.
-- É isso! – disse consigo Minho-lena – Talvez dê certo.
Aproximou-se, levando a varinha. Era tudo ou nada. Tinha que arriscar. Se o bicho-homem se virasse, ela estava perdida. Iria parar dentro da lata, como as outras.
O homem continuava quieto, sentado à beira do rio.
Nós sabemos que ele estava pescando, mas minhocas não sabem disso.
Minho-lena chegou perto o suficiente para estender a varinha, e enganchar o toco na borda da lata. Puxou com força. A lata tombou, e todas as minhocas puderam sair. Correram o mais que depressa, juntas com Minho-lena, entrando no mato e procurando ficar longe das vistas do homem.
Depois de algum tempo, quando as minhocas já estavam longe, o homem pescador se voltou para apanhar a lata, e colocar outra isca no anzol. Ficou surpreso quando viu a lata tombada e nenhuma minhoca por perto.
-- Ora! Minhas minhocas escaparam!
Levantou-se e foi embora, desistindo de pescar.
As minhocas escolheram outro local e construíram novas casas. Elas tem a vantagem de construir muito rápido.
Minho-lena, foi festejada e aclamada como a heroína de Minhocolândia, o novo nome da cidade que construíram.
Ela ficou tão famosa, tão conhecida, que logo apareceu um jovem minhoco e a pediu em casamento. Era um minhoco de boa família, e logo foi marcada a data em que os dois deveriam se casar.
Chegou o dia do casório. Tudo estava preparado.
O casamento ia ser realizado ao ar livre, no terreno logo acima das casas das minhocas. Havia mesas arrumadas com muita variedade de comidas e bebidas.

Minho-lena estava muito bonita, no seu traje de noiva.
Por fim chegou o juiz, um minhoco velho, tossindo muito e usando óculos.  Os noivos se aproximaram e a cerimônia foi realizada rapidamente, com poucas palavras. Para a família e os convidados o que importava mesmo era os "comes e bebes". E a festa começou. Todo mundo comia e bebia a fartar. Havia música e danças.
Os noivos demoraram alguns instantes, e logo partiram para a viagem de lua-de-mel.
As outras minhocas continuaram comendo, bebendo e se divertindo. Fizeram festa até quase o dia amanhecer. Então, fartas de comida e bebida, se deitaram todas por ali mesmo e dormiram.
O dia amanheceu, o sol saiu, e elas continuavam dormindo a céu aberto.
Ali perto havia um formigueiro, uma aldeia de formigas.
Uma garotinha formiga saiu para dar uma volta, e deparou com as minhocas, esparramadas pelo chão, parecendo mortas. Ela correu o mais que depressa para a aldeia e deu o alarme.
-- Comida! Carne, muita carne! Minhocas mortas, aos montões!
A notícia se espalhou na aldeia das formigas.
Logo, um batalhão delas se dirigiu ao local onde estavam as minhocas adormecidas.
-- Lá estão elas – falaram algumas formigas, ao avistar as minhocas.
-- E são muitas! – responderam outras, correndo e apressando-se.
Logo, em grupo, cercaram as minhocas, prendendo-as com os ferrões para arrastá-las e levá-las ao formigueiro.
Nesse momento ocorreu o inesperado. As minhocas estavam dormindo, mas ao sentirem as ferroadas, acordaram. Então começou uma incrível briga. As minhocas davam socos, pontapé (não me perguntem como minhocas podem dar pontapé) e rabanadas, a fim de se livrarem das formigas, que, surpresas, não sabiam o que fazer: se fugiam, ou se continuavam tentando segurar as minhocas com seus ferrões. As mesas foram reviradas, cadeiras quebradas, restos de comida se espalhou por todo o lado. Havia formiga com antena machucada, olho roxo e nariz sangrando. Do lado das minhocas, além das ferroadas, havia também contusões. Mas elas levaram a melhor. As formigas, não agüentando a fúria das minhocas, bateram em retirada.

As minhocas, correndo atrás delas, davam chutes na bunda, gritando:
-- E não voltem mais aqui, suas atrevidas!
Quando as formigas chegaram em casa, foram fazer curativos, desamassar antenas, pôr compressas... Mas a formiguinha que dera o alarme falso recebeu o castigo de cuidar de todas as formigas machucadas, fazendo remédio e colocando ataduras.
No outro dia – minhocas e formigas – foram cada uma para o seu trabalho com ataduras esparadrapos, e algumas até andavam de muletas.
Mas o incidente logo foi esquecido, e a vida continuou normal, tanto para formigas como para minhocas.
Quando Minho-lena voltou da lua-de-mel, quase morre de rir ao saber do ocorrido. E esta história foi contada aos filhos e netos, vivendo eles felizes para sempre.
                                 
                                      
                                       FIM
Para minha querida neta MILENA
Nanuque-MG, 3/12/2001.